segunda-feira, 27 de julho de 2015

A história das almas penadas



Era inverno, fazia muito frio e já passava das três da madrugada. Naquela noite estava inquieta, não conseguia adormecer. Umas horas antes, tinha tido uma conversa assustadora com os amigos na escola. Falamos de casas assombradas, de almas penadas e fenómenos insólitos. Os míudos adoram falar sobre esses temas.Talvez essa fosse a razão da minha insónia. Nas trevas da noite, ouvia-se um trepidar dos ramos das árvores, a bater insistentemente nas persianas das janelas e um assobiar constante do vento que arrastava tudo por onde passava. Uma noite realmente sinistra! Até as sombras do meu quarto pareciam personagens diabólicas retiradas de alguns filmes de terror. A conversa com os meus colegas de escola não me saía da cabeça. O Manel, colega de escola de ar franzino, mas com uma imaginação diabólica, contou-nos que os avós viviam numa casa assombrada. De noite, os avós ouviam gritos, arrastar de correntes e portas a bater. O grupo ficou logo todo arrepiado, mas mesmo assim insistiam em lhe perguntar pormenores sobre a história. Dizia o Zé, o mais curioso do grupo:- Ó Manel, mas os teus avós já falaram com eles? Eles não têm medo de lá viver!?? O Hugo, o mais medricas de todos afirmava:- Ai se fosse eu não dormia lá nem uma noite! Eu ria-me e dizia sarcásticamente para o Hugo:- És tão medricas! E o grupo ria-se em uníssono. E continuava insistentemente a atormentar o assustadiço do Hugo:- Já viste, Hugo, tu a dormires na casa dos avós do Manel e uma alma penada a puxar-te por um pé durante a noite! Ficavas logo todo acagaçado! Ah ah ah! O Hugo, já nervoso e muito assustado responde-me:- Cala-te! Se não tenho medo de ir para casa sozinho! A risota foi geral e todos achamos imensa piada, apesar de perturbados com a história dos avós do Manel. Enquanto deitada na minha cama, lembrava a expressão assustada do Hugo e de toda a nossa conversa, comecei então a ouvir umas correntes em movimento nas traseiras da casa. Vinham da escadaria do rés-do-chão até ao 1º andar. Levantei-me num ápice e fui espreitar pelos buracos da persiana, mas não conseguia enxergar nada, tamanha era a escuridão! Então, ainda descalça, dirigi-me para a porta das traseiras com uma vassoura na mão. O resto da família dormia profundamente, por isso teria que ser eu a desvendar o mistério! O som das correntes que subiam e desciam constantemente pela escadaria deixou-me com calafrios e com o coração perto da boca! Num gesto tresloucado, de uma coragem insensata, abri a porta, acendi a luz das traseiras e fiquei com a vassoura em posição de ataque! Os meus olhos nem queriam acreditar no que estava a ver! E zangada, mas também bastante aliviada, disse em voz alta: - Ah seu maroto, isto são horas para rebentar a corrente da casota e andares aqui assustar gente de bem!?? O bel, o meu cão fitou-me perplexo, a tentar entender as minhas palavras e em poucos segundos, feliz por me ver aquelas horas saltou para cima de mim e encheu-me de lambidelas e lambuzou-me toda! Pensei para comigo... Boa! Amanhã já tenho uma história sinistra para contar na escola! Pobre Hugo, vais ficar completamente traumatizado.

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